sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Diálogos #13

É Genuíno todo o sentimento que tem por necessidade ser ‘esculpido’ de modo solene, pautado e vibrante; O primeiro beijo (a primeira vez?), o primeiro sorriso de um filho, o primeiro ‘dinheirinho suado’, aquele show emocionante... Mas, infelizmente, nem sempre o genuíno é um sentimento bom. O caminhar da vida ensina, com a experiência, desprazeres únicos – que todos nós devemos viver, pelo menos uma vez; A primeira decepção amorosa, a perda ‘eterna’ de alguém que nos foi querido, o primeiro corte de orçamentos (demissão), enfim, radicais expoentes que variam conforme diversos fatores (pessoais). O que se pode assegurar em questão é que a palavra ‘genuíno’ (ou ‘genuína’) não se resume a uma peça de reposição (que custa mais caro) para um veículo; Essa palavra tem significado forte, porém abandonado – pouco interpretado, e utilizado por nossas bocas apenas no sentido comercial. É um erro. Um deslize. Se a ‘perfeição’ existisse, ela primeiro precisaria de genuidade.

Rosas têm vida. Muitos não sabem, mas rosas se abrem ao alvorecer e se fecham no crepúsculo, como se (além dos raios solares) elas abrissem suas ‘casas’ para denotar a simples presença no mundo, compartilhando cores e harmonias genuínas – embelezando qualquer paisagem.
Havia uma rosa especial, quase igual a todas as outras – fora o simples fato de que possuía o dom da fala. Uma rosa vermelha nobre e robusta, morando a beira da estrada.
Certo dia, um humano que caminhava por essa estrada, sentiu a forte necessidade de defecar – e na direção da rosa caminhou para se esconder no mato -; Se não fosse pela voz que ouviu, a rosa teria deixado de existir por causa de merda.
- Não pise em mim! – Disse a rosa.
- Quem disse isso? – Parando o humano de imediato.
- Sou eu, a rosa sob seu pé direito... Por Favor, não pise em mim. – Suplicou novamente.
O humano retirou o pé e olhou para a rosa: abismado. Era linda e imponente ao mesmo tempo em que parecia ser solitária perante o resto da vegetação.
- Tudo bem – respondeu -, não vou pisar. Como é que você fala? Por quê?
- Algumas poucas de nós temos esse dom – respondeu a rosa.
- Incrível! – Disse o humano. – Meus amigos vão morrer de inveja quando eu te levar para casa. Você será a sensação da cidade.
- Não! – Bradou a rosa. – Meu lugar é aqui, nessa beira de estrada, não na cidade com seus amigos.
- Você tem escolha? – Perguntou o humano à rosa.
- Todos nós temos: homens e todo o resto que coexiste com eles – disse tristemente. – Você pode até me tirar daqui, mas terá que enfrentar os meus espinhos. Além disso, fora dessa beirada de estrada eu jamais direi uma única palavra a ninguém.
- Tem certeza? – Perguntou o humano.
- Absoluta – disse a rosa se abrindo, como se estivesse sorrindo, como se estivesse acabado de firmar um acordo.
- Então ta bom, dona rosa – disse o humano.
Em seguida, aquele homem que jamais havia se interessado por rosa alguma (por flor alguma) fez questão de pisar na rosa falante (com toda a força do pé direito) antes de entrar mato adentro para fazer merda. Para ele não tinha valor algum algo genuíno que não pertencesse a ele.

Não existem flores ou rosas suficientes para preencher o vazio da insuficiência humana.

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